Deliberações ingénuas do umbigo. Pode um homem revoltar-se sem armas?

quinta-feira, setembro 04, 2003

Pequenez:

Amamos os corpos, as almas.
As coisas que se entranham em nós.
Salvamos. Somos salvos.
Nestas horas de lucidez,
este leito é um negro abismo.
Um detestável cruzamento de vidas.
Amargo sabor de pequenez.
A tua estória não me interessa.
Há muito que não salvo ninguém.

Palavras para ti:

Na distância dos anos, o mundo que me era estranho, entranhou-se-me. Adormeci sobre ele. O teu mundo tornou-se-me estranho. És mundo novo para mim. As nossas vidas apenas se tocam no passado. Que fazer então com tudo isto que ficou por arrumar? Arrumo-o! Sim, tive que o arrumar. Este pedaço de maravilha fica bem aqui. Arrumado. Este desenho interior tem contornos agradáveis. Foi pintado com a cor da vida. Com o azul dos teus olhos! Guardarei para sempre Palavras para ti.

A terra e o Tempo:

«Conheci uma mulher de noventa anos que, com firmeza e carinho, cavava e retirava ervas às suas videiras, fazendo-o de joelhos porque não conseguia estar de pé. O desespero dela era ver o abandono da sua vinha numa terra onde os jovens emigravam ou para a cidade ou para o estrangeiro.»

Graça Morais, Jornal de Letras